quinta-feira, 1 de fevereiro de 2007

N. Sra. da Boa Viagem

Foto: Reflections, originally uploaded by FreeMySoul

Júlio todos os dias repetia a mesma peregrinação até à capela da N. Sra. Da Boa Viagem. Todos os dias abria porta e janelas, para deixar que ventos ensolarados lavassem as paredes imaculadas do edifício; mudava a água das flores ou colhia outras, frescas, quando era caso disso; reacendia o círio vestido de encarnado, sempre que uma brisa se excedia por entre as frinchas; soprava amorosamente o pó que durante a noite se estendia, em manto, sobre o altar; deixava preces aos pés da Virgem, mais para que os seus santos ouvidos tivessem companhia, do que por ter o que pedir.
Júlio cumpria estes rituais todos os dias, ainda que na capela já não se ouvisse missa, ainda que todos os passos se tivessem alheado daquele lugar, ainda que já quase não restassem, na povoação, pernas para lá chegar. Nossa Senhora sempre escutara quem a ela recorria rogando por uma boa viagem e, talvez por isso, já todos tinham partido. Apenas Júlio permanecera, satisfeito com o pouco que tinha, ignorando que há muito mais a desejar, contentando-se em cumprir fiel e dedicadamente as obrigações de que nenhuma outra autoridade, senão a sua, o havia incumbido.

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