Um portal no meio de um bosque que deixa quem o franqueia quase no mesmo sítio de onde saiu, era como uma maçaneta sem porta. E essa provocante e transgressora inutilidade fazia-o voltar, vezes sem conta, àquele lugar e a atravessar o umbral, para lá de qualquer lógica.
Este gosto pelo desnecessário, pelo inútil, pelo que esgota em si próprio todo o objectivo da sua existência, adveio-lhe, provavelmente, dos tempos em que era funcionário público. Naquela altura, a sua função consistia em produzir uma montanha de papéis para que o posto do colega do lado, aquele que tratava dos arquivos, tivesse razão de ser. Na repartição onde trabalhava, iam buscar-se papéis aos arquivos, faziam-se cópias certificadas dos mesmos para que estas pudessem ir, por sua vez, engrossar as fileiras de papelada a arquivar noutras repartições públicas. A burocracia, pensava ele, era um movimento gracioso de multiplicação e transladação de documentos oficiosos.
Agora que estava reformado, percorria o bosque em busca de duendes, criaturas quase tão fantásticas como um trabalhador das finanças. Ninguém acredita que possam existir pessoas devotamente dedicadas a imiscuir-se nas contas dos outros e a fazer proliferar papéis, como o Cristo os peixes. Mas havê-las, há-as.
Por entre a folhagem, Secundino (assim se chamava o funcionário público) descobriu um rasto de nevoeiro, muito do agrado da sua nebulosa mente. Seguiu-o, claro está, como quem segue as normas de um procedimento, um passo após o outro, num encadeamento sequencial sem rasuras.
No fim do caminho, erguia-se, já não um portal, mas uma fachada inteira. Que não tivesse porta, não tinha qualquer importância, pois o lado de dentro era simultaneamente o lado de fora. Um paroxismo à medida do gosto de Secundino, apurado por anos a fio a trabalhar na Função Pública. Aquela iria ser, doravante, a sua morada.
Este gosto pelo desnecessário, pelo inútil, pelo que esgota em si próprio todo o objectivo da sua existência, adveio-lhe, provavelmente, dos tempos em que era funcionário público. Naquela altura, a sua função consistia em produzir uma montanha de papéis para que o posto do colega do lado, aquele que tratava dos arquivos, tivesse razão de ser. Na repartição onde trabalhava, iam buscar-se papéis aos arquivos, faziam-se cópias certificadas dos mesmos para que estas pudessem ir, por sua vez, engrossar as fileiras de papelada a arquivar noutras repartições públicas. A burocracia, pensava ele, era um movimento gracioso de multiplicação e transladação de documentos oficiosos.
Agora que estava reformado, percorria o bosque em busca de duendes, criaturas quase tão fantásticas como um trabalhador das finanças. Ninguém acredita que possam existir pessoas devotamente dedicadas a imiscuir-se nas contas dos outros e a fazer proliferar papéis, como o Cristo os peixes. Mas havê-las, há-as.
Por entre a folhagem, Secundino (assim se chamava o funcionário público) descobriu um rasto de nevoeiro, muito do agrado da sua nebulosa mente. Seguiu-o, claro está, como quem segue as normas de um procedimento, um passo após o outro, num encadeamento sequencial sem rasuras.
No fim do caminho, erguia-se, já não um portal, mas uma fachada inteira. Que não tivesse porta, não tinha qualquer importância, pois o lado de dentro era simultaneamente o lado de fora. Um paroxismo à medida do gosto de Secundino, apurado por anos a fio a trabalhar na Função Pública. Aquela iria ser, doravante, a sua morada.
(a continuar, um dia...)
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