segunda-feira, 9 de abril de 2007

António

António Balazar tinha entre pernas uma caprichosa peculiaridade: a dita só ficava dura quando o seu orgulhoso possuidor ditava ordens idem. Era vê-lo a juntar o povo em estádios, segundo uma criteriosa escolha que, no fundo, era aleatória, a bloquear as saídas com militares blindados e a exercitar polegares, qual imperador romano, com forte pendor gravítico que, quase invariavelmente, selavam o destino dos pobres coitados que outro mal não fizeram senão errar no país de nascimento.
Os arguidos (com esta designação dissimulava ele o fim certo que esperava os desgraçados), deviam superar uma série de absurdas provas, mostrando os seus talentos para manterem-se vivos, pelo menos até uma próxima convocação.
Balazar, de um patriotismo pimba, apreciava sobretudo o kitsh, o belo-horrível. Corpos disformes em strip-teases de mau gosto, mudos a cantar o fado, pernetas a dançar o fandango. Quando aparecia um número particularmente horrendo, o chefe da nação comentava entre dentes “Aqui há talento!” e o seu entre pernas ressuscitava, reclamando a presença do operador do milagre nos seus aposentos, instalados por baixo das bancadas, que o momento não era de desperdiçar nenhum minuto. Caso o milagreiro, macho, fêmea, novo, velho, humano ou bicho, fosse capaz de repetir a proeza, podia contar com mais algum tempo de vida, embora não fosse claro que isso constituísse uma verdadeira vantagem.
Quanto aos restantes assuntos da nação, era simples: os assuntos externos, não tinham, pura e simplesmente, existência - era um país orgulhosamente só; os assuntos internos, não ultrapassavam o âmbito das virilhas do ditador.
E que não cause admiração o facto de Balazar se manter no poder. Afinal, já outros ditadores antes dele, haviam sido considerados pelo povo, em circunstâncias de absoluta e livre democracia, como um dos dez Grandes do País.

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