A confraria dos cães ladra na noite, as vozes chegando onde as patas não alcançam. Carpem latindo o metro e meio de ferro que os acorrenta a um só lugar.
Maria da Fé, um embrulho de xaile negro, parte para a sua via sacra nocturna. Com os chinelos pela calçada, passa entre as casas de talha pequena em direcção à praia. Lá chegada, já não chora. Bebeu-lhe a areia a água com que lavava os olhos expectantes, como o mar lhe tragou o corpo esperado.
Enquanto Maria das Dores cumpre as estações, o seu leito arrefece. Jaime já está à janela tangendo a guitarra com os dedos que a Prazeres não quis. Desde que ela se foi, religiosamente agarrada ao último padre que por ali passou, a cama de Jaime não recebe visitas - prefere ser ele a despedir-se todas as noites nas casas das viúvas.
Quando regressa a casa, Maria da Saudade reacende a vela à foto do homem que, com o anel de ouro que ainda traz no dedo, ganhou o direito de dormir com ela às vezes.
Nada muda. Os cães calam-se.
quinta-feira, 13 de novembro de 2008
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